O Processo de um Filme.

Aos que visitam o blog pela 1ª vez, recomendamos que leiam primeiro os posts mais antigos, para compreender melhor o que estamos fazendo. Para isso basta descer nesta página e clicar em POSTAGENS MAIS ANTIGAS. Sejam bem vindos.

domingo, 4 de abril de 2010

Elisa

Família daquelas que chamam tradicional, católica fervorosa, hipócrita. Elisa - 18 anos, mineira de pai, mãe e nascença. Da religião ela entendia, tinha feito com gosto e destreza o trabalho de primeira comunhão aos 7. Era o xodó da mãe. Eram em 5 irmãos. Elisa, a terceira. Do mar pouco conhecia além dos fins de semana cinzentos com cheiro de óleo na costa do Espírito Santo, mas conseguia imaginar a maravilha da imensidão azul por um conto uruguaio que um amigo lhe mostrara. A imagem do menino que vira o mar pela primeira vez junto ao pai contaminava Elisa de tal modo, que a delicadeza daquela estória agora lhe pertencia. Elisa era virgem dos olhos do mar.
A infância foi marcada pelas férias na fazenda do tio avô - que mais tarde haveria de ser perdida pras jogatinas masculinas. Era primaiada por todo o canto. O pai, severo, em plena atividade patriarcal. Coisa que Elisa condenava sem saber bem o porquê, mas que sob o consentimento dos olhos apaixonados da mãe, teria de aceitar.
Naquele tempo havia amor entre os pais. A mãe não tinha adoecido. A família não sufocava. Tudo parecia caber na compreensão-de-menina de Elisa. Parecia leve...

Daí veio a separação, a morte, o colégio interno. Os irmãos dispersos, o fim da fazenda e da infância.
Não tinha mais os beijinhos açucarados da mãe.
Tinha era uma alma solta, confusa, que vagava nas sacristias geladas em busca de um acontecimento.

Assim formou-se a vontade da independência, a curiosidade que transbordava dos livros, a coragem que se firmava numa menina de mãos atadas, presença forte.
Elisa queria descobrir os desejos. A pele queria colar em outra pele, o coração queria pulsar mais forte, os olhos precisavam abraçar o mundo - e, certamente, não daria pra esperar os quase distantes 18 anos.
A feminilidade nascia espontaneamente naquele corpinho miúdo. O bico do peito já deformava a camiseta do uniforme branco exigido pelas freiras, a respiração palpitava. Os poros se abriam para fazer expandir a erupção de dentro de Elisa.
O corpo, num sobressalto, aqueceu as paredes mofadas da capela principal. Era vapor pra todo lado. Então o sino bateu e a porta do colégio interno se abriu. Não tinha ninguém esperando por ela, nem família, nem fazenda, nem conto uruguaio.
Só o vento.

2 comentários: